sexta-feira, 11 de maio de 2018

[Crônica] Uma Lição Inesquecível

    Na semana passada vivi mais uma experiência incrível como corredor de rua. Já postei aqui no blog algumas delas, mas essa foi verdadeiramente especial. Conforme contei aqui há algum tempo, frequento uma academia que, semestralmente, organiza uma corrida indoor. O regulamento desse evento é bem simples: os participantes têm 20 minutos para conseguir correr a maior distância que conseguirem.

    Em abril do ano passado ocorreu a primeira edição de 2017, na qual tive o prazer de ficar com o primeiro lugar geral. Na época fiquei muito feliz com essa conquista e passei a acreditar que não precisaria fazer muito esforço para conseguir sempre ficar no pódio dessa prova, já que no ano anterior eu havia conseguido ficar em segundo lugar. Contudo, esse foi um erro que só fui descobrir seis meses depois.

    Acreditando que poderia fazer apenas treinos "meia-boca" para participar da prova, em outubro de 2017 me inscrevi para a segunda edição. Alguns dias antes dela, brincava com os professores afirmando que o pódio já estava garantido e que eu iria brigar pelo bicampeonato. Também ficava contando para todo mundo que o atual campeão era eu. Essa soberba acabou me fazendo "cair do cavalo".

    Tentando repetir a estratégia vencedora de abril, me inscrevi para a primeira bateria do dia, que ocorreria às 7:30 da manhã. Só que eu não contava com um pequeno detalhe que me atrapalhou: a professora que estava organizando aquela bateria pediu que todos os corredores corressem com uma leve inclinação na esteira. Eu estava contando que correria sem inclinação nenhuma e isso fez com que minha estratégia de corrida se tornasse mais difícil. Com a respiração descontrolada e os pensamentos chacoalhados a ponto de não me permitirem organizar uma estratégia, acabei fracassando e conseguindo fazer apenas 4,42 km, cerca de 100 metros a menos do que havia obtido na edição anterior.

    Apesar disso, ainda acreditava que conseguiria uma posição no pódio. À noite fui assistir a última bateria para ver como eu ficaria posicionado. Ao chegar o professor encarregado de organizá-la me deu uma má notícia: vários participantes haviam conseguido superar a marca de 4,80 km nas baterias anteriores. Para completar, assisti aquela última bateria e, ao término dela, um dos participantes havia completado 5 km nos 20 minutos. No final das contas, acabei ficando em sexto lugar e com a certeza que eu não era o "rei" da corrida da academia, coisa que eu acreditava ser antes dessa derrota.

   Nos dias seguintes fiquei dividido entre a razão e a emoção. A razão me dizia para não participar mais desse evento, pois com esses novos competidores eu não teria mais chance. Já o coração me falava para participar mesmo assim, pois eu sentia prazer de estar ali, mesmo num patamar inferior.
Foi aí que tomei uma decisão importante: iria criar, por conta própria, um treino altamente intenso que me permitisse, seis meses depois, ficar mais próximo das distâncias obtidas por daquelas feras.

    Exatamente uma semana depois daquela perda, comecei a realizar esses treinos, uma vez por semana. Gravava os resultados, um por um, num aplicativo de corrida instalado no meu celular e comemorava cada metro que iria evoluindo. Um dos professores da noite, aquele responsável pela última bateria, se tornou meu amigo e me incentivava em alguns desses treinos. Em dois meses, eu já havia conseguido chegar a 4,62 km, isto é, 200 metros a mais do que eu havia feito na corrida. Apesar de ser um grande feito, ainda estava longe de alcançar aquela galera que havia ficado nos 5 primeiros lugares da corrida, pois 4 deles ficaram acima de 4,80 km e o campeão feito em 5 km.

    Continuei treinando intensamente até o mês de abril de 2018, quando uma nova edição da corrida foi marcada. Me inscrevi logo no primeiro dia, mas não tinha conseguido superar, nos treinos, aquela marca de 4,62 km. Tinha consciência total que seria muito difícil subir ao pódio novamente.
Dessa vez havia me inscrito na última bateria, que seria à noite, e aquele meu amigo professor seria o responsável por ela.

    No dia da prova, pela manhã, eu havia passado em frente a academia e observei que a primeira bateria estava rolando com cerca de quatro participantes e o campeão da edição anterior estava lá. Ao lado dele, havia um outro corredor muito bom. Fui para o trabalho convicto que eles haviam ido muito bem.

    Ao chegar para fazer minha bateria noturna, consegui ver no papel do professor que o campeão da última edição havia conseguido fazer um pouco mais de 4,90 km e o outro corredor que eu citei havia feito 4,74 km. Aquilo foi uma ducha de água fria. Para completar, na minha bateria iriam participar um maratonista e um garoto de 17 anos que, respectivamente, haviam ficado em terceiro e segundo lugar na edição anterior, superando a marca dos 4,80 km. Além disso, havia mais um rapaz de 17 anos que parecia correr bem e o quinto participante era o Tiago, um amigo que malhava comigo e que eu insisti para participar, mas que não tinha chance nenhuma contra essas feras. Vocês acham que essa dificuldade toda já era suficiente? Para completar eu estava sentindo dor de garganta. A tal da lei de Murphy se fez presente, pois passei seis meses treinando sem pegar nenhum resfriado e ele veio justamente na semana da corrida.

    Nos posicionamos nas cinco esteiras. No meu lado direito ficou um dos garotos de 17 anos e no meu lado esquerdo o meu amigo. Nas pontas ficaram os dois favoritos. Ao começar a prova, tive a primeira surpresa boa: coloquei 15 km/h de velocidade e vi que estava aguentando bem. Só que o corredor do meu lado direito estava correndo a 15,5 km/h. Eu lutei intensamente para conseguir me manter na minha velocidade de 15 km/h por mais tempo possível com a esperança dele ter que reduzir em algum momento. Consegui ficar inexplicáveis 8 minutos nessa velocidade e, para respirar, reduzi para 12,6 km/h. Foi aí que tive sorte. Nesse mesmo minuto, aquele participante reduziu para 12 km/h fazendo com que nossas distâncias começassem a se tornar equivalentes. Depois de 4 minutos nessa velocidade consegui correr mais outros 4 a 15 km/h, reduzindo para 12 km/h nos próximos 2. Ao chegar a 18 minutos de prova, vi que estava praticamente empatado com ele e foi então que fui para o tudo ou nada. Coloquei 15 km/h no penúltimo minuto e, faltando apenas 30 segundos, coloquei 16 km/h. Naquele instante, não conseguia mais olhar para os lados e, para minha surpresa, vi que conseguiria superar tranquilamente aquela minha marca de 4,62 km. Ao final, tive a imensa alegria de ter alcançado 4,72 km. Ao olhar para o lado direito vi que meu concorrente havia feito apenas 4,68 km. Eu tinha conseguido vencê-lo. O maratonista de uma das pontas conseguiu chegar a 5 km cravados se tornando o campeão da corrida. O outro favorito, aquele de 17 anos, só conseguiu fazer 4,68 km. Meu amigo ficou para trás e, no final, me disse que estava torcendo por mim. O mesmo dito a mim pelo professor depois da prova.

    Ali eu já tinha conseguido duas coisas que me deixavam extremamente orgulhoso comigo mesmo. Consegui uma marca espetacular de 4,72 km e tinha vencido duas feras. Após tirar algumas fotos com os outros participantes, fui para casa muito feliz e, mesmo tendo ficado em quarto lugar, tive uma sensação de vitória. Além disso, tive uma coisa que nenhum outro participante teve: dois amigos torcendo por mim. A amizade verdadeira é algo maior que qualquer troféu ou medalha.



    Nos dias que se sucederam continuei feliz com meu desempenho, mas não fui à academia pois a dor de garganta se agravou e a gripe se tornou extremamente forte. Ao melhorar, exatamente uma semana depois da prova, voltei a academia para apenas malhar. Me lembro como se fosse hoje que saí de casa com a certeza que tinha ficado em quarto lugar. Eu sabia que, ao chegar, iria ver o quadro com o resultado do pódio da corrida sem meu nome nele.

    Ao entrar na academia, tomei um imenso susto. A gerente estava no balcão e, logo que me viu, começou a falar que queria tirar uma foto comigo e que eu havia sido um dos campeões. Em seguida, numa fração de segundos, vi meu nome no quadro como terceiro lugar. O corredor que havia ficado  em terceiro havia sido eliminado por descumprir uma das regras e eu fui para o pódio. Fiquei sem reação. Completamente eufórico disse a ela que iria rapidamente para casa (moro perto da academia) a fim de buscar minha camisa da corrida e meu celular para tirar fotos.

    Ao voltar, tirei foto com o certificado da premiação, mas minha ficha ainda não tinha caído. De forma emocionada, agradeci aos dois amigos que estavam comigo na prova, o professor Sócrates e o amigo Tiago. Voltei para casa ainda embasbacado com tudo que havia acontecido. Foi difícil dormir naquela noite depois de receber aquela notícia tão boa.

    Posso garantir que esse foi o pódio mais especial da minha carreira de corredor até agora. Com ele aprendi grandes lições:
1) Nunca subestimar os adversários. Humildade é tudo!
2)  Se queremos evoluir, temos que nos dedicar intensamente para isso.
3) No grande dia da corrida, faça a sua parte da melhor forma que puder e se esqueça dos outros.
4) O segredo de tudo é: treinos, perseverança e apoio de amigos.
5) Tenha certeza que, se você for merecedor, o Universo irá conspirar a seu favor.


 
 

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